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segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Adesão da advocacia ao certificação digital é baixa

O processo eletrônico pode trazer muitos benefícios à população, principalmente por diminuir a burocracia e o tempo de tramitação das ações judiciais. Mas, para os advogados, ele ainda pode ser um grande problema. Dos 672,1 mil advogados registrados na OAB, apenas 68,8 mil têm certificados digitais para fazer peticionamentos eletrônicos e ter acesso à Justiça digital.

Esse número representa pouco mais de 10% de todos os profissionais do país, segundo dados da Certisign, empresa que emite a maior parte dos certificados para os advogados. Por outro lado, é uma cifra que cresce com relativa rapidez. A Certisign cadastrou 31,9 mil novos registros entre janeiro e agosto deste ano, o que já é um salto de 28% em relação ao ano passado inteiro, com 24,8 mil novos certificados digitais. Frente 2009, porém, o ano de 2010 registrou um crescimento de quase 120%.

Paulo Cristóvão Silva Filho, juiz auxiliar do Conselho Nacional de Justiça, entretanto, lembra que existem outras entidades certificadoras no país. Sendo assim, ele afirma que o Brasil tem entre 200 mil e 250 mil advogados ativos, segundo a OAB. Desses, cerca de 35 mil têm certificações digitais, o que dá em torno de 20% — ainda baixo, segundo ele. Entre as entidades que registram certificações, estão Serpro, Caixa Econômica Federal e a Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp) — esta última só para os advogados registrados em São Paulo.

O número ainda é baixo, segundo Paulo Cristóvão, mas é porque ainda não há a obrigatoriedade do certificado. "Há uma acomodação natural de permanecer com o status quo", afirma. Quando houver a obrigatoriedade, prevê, essa demanda vai aumentar naturalmente.

O juiz auxiliar informa que o CNJ e o Judiciário ainda não tornaram as certificações obrigatórias a pedido da OAB. A Ordem, diz, quer que antes sejam feitas mais campanhas de inclusão digital e de redução de preços, para que depois haja a obrigação. Uma certificação digital da Certisign, já impressa num chip na carteira da OAB, sai por R$ 120. Uma leitora do chip custa, em média, R$ 160.

Injustiça digital
Segundo o presidente do Conselho Federal da OAB, Ophir Cavalcante, no entanto, os números da Certisign são "injustos". Ele explica que alguns tribunais criaram sistemas de cadastro, por meio de login e senha, sem exigir certificados digitais, e muitos advogados os usam. E esses não são computados nos dados da companhia certificadora.

Mesmo assim, Ophir reconhece que a advocacia anda a passos lentos em direção à inclusão digital. Ele aponta dois fatores principais: resistência cultural e falta de estrutura do Judiciário e dos tribunais. O último motivo, diz, é técnico e passa pela falta de "maquinário adequado" da maior parte dos tribunais brasileiros, que não têm condições de armazenamento de arquivos, ou computadores suficientes. "Há sistemas que não aguentam processos com mais de mil páginas, por exemplo."

Paulo Cristóvão, do CNJ, entretanto, afirma que a maioria dos tribunais faz isso propositadamente. Eles impõem limites de tamanhos de documentos que podem ser peticionados eletronicamente, como é o caso do Supremo Tribunal Federal, que permite 10 MB por documento. "Imagine que você peticiona um arquivo mil páginas, ou uns 20 MB, mas a pessoa que vai receber tem uma conexão de internet discada. Os tribunais fazem isso para garantir o direito de defesa, para que todos possam ter acesso a todos os documentos."

Quanto à resistência cultural, Ophir Cavalcante, da OAB, explica que a maior parte dos advogados vem de gerações que não estão acostumadas com o computador. Passaram toda sua vida profissional lidando com processo em papel, e de repende têm de lidar com documentos digitais, em telas de computadores. Isso, inclusive, exige uma série de investimentos "anormais" aos advogados, como scanner, ou a máquina leitora de certificados digitais.

"Falta de sensibilidade"
Esses investimentos, continua Ophir, são outro motivo importantíssimo para o atraso dos advogados, em relação ao Judiciário, no processo eletrônico. "Pessoas físicas não têm a mesma velocidade de investimento que o Estado, que já gastou milhões de reais com diversas versões diferentes de programas", explica.

Parte desses investimentos foi nos chips das carteirinhas, onde vêm inscritos os certificados digitais. Ophir Cavalcante informa que, há dois anos, o Instituto de Tecnologia da Informação do governo federal (ITI) optou por uma tecnologia de certificação. Ano que vem, porém, essa tecnologia-padrão vai mudar, de novo por determinação do ITI, segundo o presidente do Conselho da OAB.

Ou seja: "os advogados tiveram de gastar dinheiro com esses chips, para refazer suas carteirinhas [um certificado digital custa R$ 120], e agora vão ter de gastar de novo por essa falta de sensibilidade do governo com o assunto", reclamou o advogado.

Desigualdade regional
Os estados também são diferentes em relação à inclusão digital dos advogados. O Paraná é o estado mais conectado, com 54% de seus profissionais com registros na Certisign — ou 20,8 mil pessoas, dos quase 40 mil advogados do estado.

O paranaense José Ricardo Cavalcanti de Albuquerque, da Comissão de Direito Eletrônico do Conselho Federal da OAB, defende a teoria da obrigatoriedade, do CNJ. Ele explica que o alto índice de advogados com certificado de seu estado se dá por conta da Justiça do Trabalho local. Lá, conta, quase 80% dos tribunais trabalhistas já são inteiramente digitais. Além disso, todos os Juizados Especiais Federais já são adeptos do processo eletrônico.


Pedro Canário

sábado, 3 de setembro de 2011

Fiança, crimes hediondos,prisão: como interpretar a nova redação do CPP


A terceira e última manhã de debates do seminário “A Reforma do Código de Processo Penal”, que se realizou na Sala de Conferências do Superior Tribunal de Justiça (STJ), teve como tema “Modalidades de Prisão e a Reforma do CPP”, palestra apresentada por Antonio Scarance Fernandes, professor titular da Universidade de São Paulo.

Após as saudações do ministro Sebastião Reis Júnior, que abriu o encontro na manhã desta sexta-feira (2), o professor começou sua palestra debatendo o novo texto sobre a prisão em flagrante: ‘É importante ressaltar que a prisão em flagrante, com a reforma, se transformou em uma pré-cautela. Mas também temos a situação de prisão preventiva: a cautelar por excelência.” Scarance explicou que as alterações no código deram ao juiz, no caso do flagrante, três possibilidades de decisão: relaxamento da prisão, juízo de “cautelaridade” e conversão do flagrante em preventiva. “O fundamental é entender que o cerne da reforma é dotar o juiz de um poder cautelar maior, saindo dos extremos de deixar solto ou manter preso”, ponderou.

Scarance apontou que a possibilidade de transformar a prisão em flagrante na modalidade preventiva vem levantando muitos debates no meio jurídico. “Acredito que, nesse caso, é preciso observar todos os requisitos legais para que seja feita a conversão. Só posso admiti-la desse modo”, disse. Quanto ao inciso terceiro, que prevê a concessão de liberdade provisória com ou sem fiança, o professor advertiu: “Esse ponto é muito delicado, pois a fiança, no Brasil, não tem o prestígio que tem no Direito norte-americano, onde ela rege todo o sistema penal. O tema é fruto de intenso debate no Supremo Tribunal Federal, mas fica a pergunta: o que é a liberdade provisória depois da reforma?”

Refletindo sobre o assunto, Scarance afirmou que a discussão mais importante abrange, no caso do flagrante, a possibilidade de decidir pela liberdade provisória sem o ônus de outras medidas cautelares restritivas de direito. “Há os que pensam que sim, baseado no princípio constitucional da presunção de inocência; mas há os que dizem que não, pois quebraria o sistema. Fui do Ministério Público por 23 anos e minha linha de pesquisa é a eficiência e a garantia. Entretanto, acredito que a liberdade provisória pode, sim, vir acompanhada por algumas restrições impostas pelas medidas cautelares, como, por exemplo, o comparecimento periódico emjuízo”, observou.

Crimes hediondos

Todavia, o que fazer em relação aos crimes hediondos? “Se há a interpretação de que a liberdade provisória é sem ônus, não é cabível nem fiança nem outra medida cautelar alternativa à prisão. O tema está sendo analisado no STF. Mas acredito que o legislador, ao estabelecer o crime inafiançável, quis dar um caráter mais grave ao delito, uma ideia de que existe uma cautela maior do que a fiança. Não que é para barrar outras medidas cautelares cabíveis. Tornar a prisão preventiva obrigatória não me parece a melhor opção”, apontou Scarance.

No entendimento do professor, o ajuste necessário na legislação estaria na criação de medidas cautelares mais severas que a fiança para os crimes de maior gravidade. “Eu penso que é possível caminhar nesse sentido. Nos casos de homicídio qualificado, por exemplo, suspender a atividade econômica ou determinar o recolhimento domiciliar, além da monitoração eletrônica”, sugeriu.

Em relação à prisão preventiva, Scarance explicou que a reforma trouxe ampliação do conceito, admitindo a forma clássica, que se constitui na hipótese de o indivíduo estar solto e ser preso; a que resulta da conversão do flagrante; a que é determinada devido à dúvida acerca da identidade civil da pessoa, que não fornece meios para o devido esclarecimento; a decorrente da violência doméstica e, segundo o professor, a mais polêmica de todas: a que resulta do descumprimento das medidas cautelares alternativas.

“A prisão preventiva em decorrência da violência doméstica visa a garantir a aplicação de medida protetiva. Em relação à mulher, temos a Lei Maria da Penha. Para as crianças e adolescentes, existe amparo no ECA e, relativo aos idosos, podemos encontrar algo no Estatuto do Idoso. Porém, na questão do enfermo ou pessoa com deficiência, expressos na nova redação do CPP, há um vazio regulatório. Existem juristas entendendo que é possível estender a interpretação da lei Maria da Penha para outros membros da família, mas, na minha opinião, não é o caminho”, salientou Scarance.

O professor também debateu o recolhimento domiciliar e a prisão domiciliar. “São semelhantes na execução, mas totalmente diferentes em suas naturezas, pois o primeiro é medida cautelar alternativa à prisão e o segundo é modalidade de prisão preventiva”, argumentou. Para o professor, os incisos três e quatro do artigo 318 são os que mais dão margem a debates e resistências por parte do meio jurídico.

Diz o CPP que “poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for: III – Imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de seis anos de idade ou com deficiência; IV – gestante a partir do sétimo mês de gravidez ou sendo esta de alto risco”.

“Para mim”, comentou Scarance, em relação ao primeiro inciso, “há que fazer interpretação restritiva. É preciso que não haja mesmo ninguém para cuidar dessa criança e que ela realmente demande cuidados especiais.” Quanto à hipótese de gravidez, ele afirmou que “o legislador não diz até quando essa mulher deve ficar recolhida em casa. O bebê nasce e depois? Faltou delimitação de prazos”.

Antonio Scarance finalizou a palestra destacando que a reforma, exatamente por ser nova, ainda precisa de amadurecimento: “É uma lei importante, que alterou um modo de operar o Direito que existia há muitos anos. Então, só o tempo trará as melhores interpretações.” Pensamento corroborado pelo ministro Sebastião Reis Júnior: “A reforma é um emaranhado de leis complexas. E as dúvidas não são apenas minhas, ainda bem.”


Foto – Ministro Sebastião Reis Júnior e o professor Antonio Scarance Fernandes, no último dia do seminário sobre a reforma do CPP.

Coordenadoria de Editoria e Imprensa

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